Iguape
A fundação de Iguape está associada à expansão marítima européia e, ao início da colonização portuguesa no Brasil. Há relatos, não comprovados, que em 1498 um grupo de espanhóis teria desembarcado na região, dando origem a um pequeno povoado, chamado de Iguape (a origem da palavra é atribuída, por alguns, a uma planta bastante comum na região, denominada aguapé ou rainha das águas e, para outros a palavra tem origem na língua tupi-guarani). Alguns anos depois, o local teria sido atacado por piratas, com a destruição dos registros oficiais. O fato é, que a situação geográfica de Iguape, nas proximidades da linha demarcatória estabelecida pelo Tratado de Tordesilhas, tornou o local palco de conflitos entre portugueses, espanhóis e mesmo franceses, que ali aportavam na condição de piratas, para restabelecer, pilhar ou trocar mercadorias. O seu fundados teria sido Rui Garcia Mosquera, um refugiado espanhol que, aportando com outros companheiros, conseguiu estabelecer relacionamento com os índios tupiniquins, fundando a cidade, por volta de 1537, o que demonstra que os primeiros anos da história de Iguape, teve marcante a presença espanhola. Assim, os conflitos iniciais entre os portugueses, conhecidos como vicentinos e os espanhóis, como caparenses, refletiam a disputa pelo direito de posse dos produtos da região e o próprio direito de assumir o domínio em nome de seu rei. A época da fundação da "Freguesia de Nossa Senhora das Neves de Iguape" aponta muitas divergências: alguns acham que foi em 1536, outros 1537 e mesmo 1538. A vila teria sido fundada em frente à Barra do Icapara e depois transferida para o local onde se encontra. Outrossim, para evitar polêmica sobre o assunto, a Câmara Municipal da cidade tomou a iniciativa de oficializar o dia 03 de dezembro de 1538, como a data de sua fundação.
Portanto, a história de Iguape se inicia com a do Brasil. Nos primórdios do século XVI, os portugueses se limitaram a viagens de reconhecimento da costa, e à exploração do pau-brasil. Alarmados com as notícias de estrangeiros se estabelecendo em aldeamentos isolados e a presença de piratas, atraídos pelos rumores das riquezas, a coroa portuguesa enviou ao Brasil uma expedição exploradora, guarda-costas e colonizadora, sob o comando do Fidalgo Martim Afonso de Souza, futuro donatário da Capitania de São Vicente. Em agosto de 1531, aportou na Ilha do Bom Abrigo, perto da atual Cananéia, na região sul, onde encontrou um bacharel degredado havia trinta anos, acompanhado de cinco ou seis castelhanos, que pode ter se chamado Francisco de Chaves, Duarte Pereira ou Cosme Fernandes Pessoa. Informado sobre a existência de grandes riquezas de prata e ouro no interior, mandou Pero Lôbo com oitenta homens (besteiros e espingardeiros). Somente depois de algum tempo houve notícias de que haviam sido mortos pelos indígenas localizados entre os rios Iguaçu e Paraná (essa expedição é considerada uma das primeiras "entradas" em busca de ouro e pedras preciosas no interior do Brasil). Dessa primeira expedição, não se obteve resultados, mas o fato é que o ouro foi encontrado alguns anos depois, na região do Alto Ribeira.
Em 1532, Martim Afonso de Sousa fundou oficialmente o povoado de São Vicente. Assim, reforçava-se a presença portuguesa na região, proporcionando condições para a posterior expulsão dos espanhóis para o sul. A fundação da Freguesia de Nossa Senhora das Neves de Iguape se consolida com o surgimento de outras povoações, à mesma época, nas regiões vizinhas, como Santo André da Borda do Campo, Nossa Senhora da Conceição de Itanhaem e São Paulo de Piratininga. Assim, Iguape, erguida junto ao mar próximo à foz do Rio Ribeira, em localização privilegiada, tornou-se caminho de penetração para o interior e, se insere no ciclo de "ouro de lavagem" (ou de aluvião). Esse ciclo desenvolveu-se em especial na zona litorânea, com início em São Paulo e atingindo até à região do Paraná. Os colonos paulistas saíam à procura do ouro, não só por iniciativa própria, como também por ordens do governador português. Em 1570 e 1584 Heliodoro Eobano chefia uma bandeira que encontra ouro de lavagem em Iguape, Paranaguá e Curitiba.
A conformação do Vale era muito favorável ao processo de ocupação e povoamento, uma vez que o Rio Ribeira serpenteia toda a região e, com seus inúmeros afluentes, perfeitamente navegáveis, deságua no Atlântico, o que facilitava ainda mais o adentramento de portugueses e espanhóis. A descoberta do ouro na região da Serra de Paranapiacaba, trouxe para o Rio Ribeira e seus afluentes um intenso tráfego fluvial, onde surgiram as cidades de Sete Barras, Juquiá, Registro, Jacupiranga, Pariqueraçú, Apiaí, Iporanga e outras. Quanto mais o interior era ocupado, mais de desenvolvia Iguape, que se tornava a ponto obrigatório de passagem para outros lugares, inclusive, para o Rio de Janeiro.
No século XVII, enquanto Cananéia se destacava por sua produção de farinha e pela pesca, Iguape atraía cada vez mais gente em busca de ouro, e sua importância nesta exploração pode ser avaliada pelo controle que a Metrópole procurou estabelecer, com a criação da "Casa da Oficina Real de Fundição de Ouro", a primeira Casa da Moeda no Brasil, onde hoje funciona o Museu Municipal de Iguape. Nessa época, a abundância de ouro era tanta, que as mulheres chegavam a usar pó de ouro nos cabelos e na maquiagem.
Por volta de 1780, com a decadência do garimpo, o ciclo de ouro chegara ao fim, com muitas famílias abandonando a região e muitos núcleos chegando a desaparecer. Entretando, desde o ínicio do século XVIII, os mangues, os charcos, as várzeas e os brejos, propícios ao cultivo de arroz, já vinham sendo utilizados em grandes plantações. Esse arroz produzido, de excelente qualidade, passou a ser intensamente comercializado em Iguape, com destino à Europa.
O sucesso dessa exportação, provocou a partir de 1840, o renascimento de Iguape, iniciando um novo período de prosperidade, cujo apogeu econômico se estendeu por volta de 1900. Nesse período, pelo menos cinco beneficiadoras do produto trabalhavam com força máxima, chegando a lotar dez grandes navios, em média, por semana.
Na época, a sua importância como o porto, estava diretamente ligada ao Rio de Janeiro (capital do país) e não a São Paulo, que era a capital do Estado. E, mais uma vez, o Vale do Ribeira vai aproveitar os meios de comunicação que a natureza lhe proporcionou, ou seja, os rios. Isto incentivou o surgimento da navegação fluvial, com linhas freqüentes de barcos a vapor, para escoar a produção até a cidade, para sua comercialização, beneficiamento e exportação pelo porto de Iguape. Como conseqüência, desenvolve-se a indústria da construção naval da região, com embarcações necessárias ao transporte de arroz. O afamado "arroz de Iguape" era procurado em todos os centros consumidores. Para se ter uma idéia de sua importância, em meados do século XIX, dos 119 engenhos de beneficiamento existentes na Província de São Paulo, pelo menos 100 se localizavam no Vale do Ribeira. Assim, Iguape se consagrou como pólo econômico mais importante na região, chegando a possuir seis jornais, uma escola agrícola (desde 1858), um Consulado Francês permanente (até 1905); para se ter uma idéia, a sua população estava a acostumada a freqüentar espetáculos, vindos diretamente da Europa.
Iguape possuía dois portos: um marítimo, no Mar Pequeno e outro fluvial, no Rio Ribeira de Iguape, nas proximidades da cidade. Além do arroz, diversos produtos como milho, feijão, mandioca, aguardente e outros eram transportados por embarcações até o porto marítimo, onde eram embarcados navios de grande calado. No sentido de facilitar o transporte, assim como baratear o preço dos produtos para exportação, foi solicitado a preço dos produtos para exportação, foi solicitado a D. Pedro II a abertura de um canal que unisse o porto fluvial ao porto marítimo. Considerando a importância de Iguape, na época, nivelada a do Rio de Janeiro e mesmo de Salvador, não houve dificuldades para liberação daquela que seria considerada uma das primeiras e mais importante obra hidráulica do país: o Vale Grande.
Em 1855, estava concluído o canal de 4m de largura e 2km de extensão, ligando então o porto fluvial ao marítimo, criando uma ilha artificial (a Ilha de Iguape). Assim as águas volumosas do rio, agora encontrando um caminho mais curto para o mar, passaram a entrar pelo canal, corroendo os barrancos e invadindo os terrenos ribeirinhos. A ação erosiva do Rio Ribeira sobre as margens do Vale Grande, colocou em perigo a própria segurança da cidade. Em menos de um século, a largura do canal passou de 4 para 300 metros. Os sedimentos carreados pelo rio foram depositando no Mar Pequeno, promovendo o assoreamento do porto, de tal forma que, já no início do século XX acabou por impedir a aproximação de embarcações.
As dificuldades no atracamento dos navios, inviabilizando o porto, iniciam uma crise fatal que conduz à decadência econômica da região. Essa situação se concretiza com as medias adotadas pelo governo para favorecer o porto de Santos, entre as quais, a construção da Estrada de Ferro Santos-Juquiá, em 1914.
A região, com uma economia ativa nos séculos XVIII e XIX, foi praticamente abandonada no início do século XX, pelas dificuldades de acesso terrestre, pelas terras de baixa produtividade e pela mudança do eixo de exportação.
O atraso econômico da região se constituiu no principal fator do estado de preservação das florestas e manguezais do Vale do Ribeira.